quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Rodoviária

Tua noite e teu dia
Tudo teu
Propriedades inapropriadas
Dualidades registradas
Girei incrédulo da realidade
Não parecia uma voz tua
E era.

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Espirais da Percepção

Adormecida de vergonha, com dores pelo corpo...
Não era essa melhor maneira de vê-lo morto?
Não! Jamais o faria; A vingança é fraqueza!
Aliás, ser forte não significa torpeza.
O tempo cura tudo
Menos de nascença o mudo
Cujo escudo ignóbil do silêncio
Tarda justiça, animal no cio...

e assim, nos tornamos iguais
acordada e burra, não voltarei atrás


- Contou a menina estuprada que não podendo contar a ninguém trama a morte de seu estuprador

domingo, 3 de março de 2013

Lápis 3B

Numa manhã de domingo Robert vasculhava a pequena e empoeirada biblioteca de sua mãe. Os raios de sol que entravam pela janela do telhado espetavam aqueles livros revivendo-os da triste escuridão porque se mantiveram por muitos anos. Vítima dessas doenças que afetam pessoas de mais idade, a longeva mãe de Robert mal lembrava o nome do filho, e talvez por isso, pelas lembranças do passado de sua mãe é que Robert encontrou motivo para satisfazer curiosidade dos gostos infantis pela leitura que sua mãe nutria em tenra idade. Era melhor não agitar muito aqueles livros da instante, pois possivelmente a ação do tempo, a exemplo do que ocorrera com os primeiros exploradores que adentraram um sarcófago das pirâmides, poderiam lhe trazer dentre outras maravilhas uma doença respiratória - Robert era hipocondríaco - e chegar até ali mascarado, aventurar-se no sótão com a cara de um cirurgião e luvas de látex trazia para dentro de si um orgulho um pouco esquisito, mas naquelas circunstâncias perfeitamente compreensível, uma vez que desde a infância jamais tinha subido as escadas daquele sótão. Ainda com um pouco de medo, de braços cruzados em frente aquela instante armada de metal, e sem sucumbir retira com os dedos em pinça o primeiro livro escrito a lápis na lateral, o que lhe chamar muito atenção. Uma série de fotos da sua mãe na adolescência faziam parte da capa do livro, eram fotos em preto e branco sobrepostas umas as outras as quais faziam um pequeno painel. Abriu o livro, tinha o nome da editora e tiragem de mil exemplares. A dedicatória escrita a lápis datada de 1933 dizia:- Sou dono de um restaurante, e todos domingos você e sua família sentavam-se à mesa que por toda sua infância fez parte de um dos momentos mais alegres que eu tinha. Seus olhinhos instigadores me deram ânimo e inspiração para escrever estas histórias infantis que dedico a você. Minha filha seria uma adolescente cheia de vida e falante como você, mas os eventos inexplicáveis de nossa passageira viagem por aqui, a tiraram de mim por razões que tentei entender, mas que depois de a conhecer me trouxeram o alento que necessitava traduzido nestas histórias que mexiam com a imaginação dela. Ela amava minhas histórias, as quais foram criadas em co-autoria dela. Hoje você está mocinha e talvez pouco importe as fantasias infantis desta obra que demorei anos para concluir, entretanto creio na sua grandeza sentimental, e que sem você esta obra jamais teria sido escrita.
Lúcio de Moraes.
Espantei-me com aquela escrita a lápis já borrada. O livro tinha mais de cem páginas! Retirei-me do sótão, a claustrofobia me esmagava, não sei como consegui ficar tanto tempo lá em cima.
Limpei toda poeira, e fui até a cadeira de balanço onde minha mãe ficava todas manhãs olhando para o horizonte esperando a morte chegar. Faziam cerca de cinco anos que ela não falava, seus olhinhos vidrados na paisagem a tornaram indiferente a mim e as enfermeiras. Mostrei-lhe o livro pela capa, e ela sorriu e disse: - Lúcio.
To be continued

terça-feira, 27 de março de 2012

É tudo piada!


por todos abandonos cometidos pagarei
aos berros a vida reclama pelas injustiças!
o céu desbotado derruba suas vísceras
de medo me enlameei

é tudo piada, à expectativa de nada!
deboche total
insignificância real
quem merece um lugar ao sol?

Endoida furtivamente o esfincter do mundo
o humano vagabundo
odioso ser, repugna o próprio entorno
em busca de mais e mais adorno

Pra quê? Poeira! Amor?
Sem início, sem começo, sem fim
poeira, caro leitor! Poeira!
(risada de canto de boca)

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Anagrama da tristeza do cisne

Devo afastar-me desse amor lento que não ouve quando lamento?
a maior sede de quem ama é o arrebatamento de quem se quer...

Aos trinta anos, o zeloso vê no mínimo mais cinquenta a perder
estatística-mente, embora amar não seja jamais idade um empecilho
especialmente para alma-mente de ideias vivas a arder
onde o amor carnal que lhe parecia fundamental
numa idade mais avançada velho, certamente
os gritos de uma morte anunciada na juventude
precipitam a morte do amor visceral submerso
em breves versos de um jovem homem
que ao pensar em sua senilidade implacável
não vê senão outra pessoa além...
para estar na plenitude do pertencimento
junto num viver inenarrável
desprovido do teu desdém

tempo curto amor eterno
vida longa sem teu amor

depois do fim voltarei cisne
s-e-n-t-i, sou t-i-s-n-e.
Anagrama do cisne sem-ti.  

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Foi como quis.

Despediu-se naquela manhã de julho. Aliás, não foi bem uma despedida, pois contido naquele beijo matinal que recebia enquanto dormia, já elucubrava em nunca mais vê-la, ficando a última imagem dela numa lembrança de silhueta que na porta aberta do quarto o sol da manhã descrevia. Existem monstruosidades necessárias, ou somente são atributos das mentes doentias? Em realidade, doía-lhe não ter se despedido decentemente, e o orgulho dela o surpreendeu quando deixado de lado recebera naquela mesma tarde um ligação que questionava a racionalidade vil daquele gelado coração.
Se conscientizou de que não merecia o amor dela, nem tampouco o carinho, e absorto não raras vezes revivia aquele momento crucial de separação, que o fez escolher entre ela e a outra incerteza da vida que é viver só. Nunca mais se falaram depois daquela ida sem sequer um bilhete em cima da mesa! Foram apenas tentativas infrutíferas de enviar cartas para remediar a irremediável covardia que foi abandoná-la. Ao fim, queria dizer daquelas poesias, pois as perdeu. E como não poderia deixar de ser, os deuses da poesia não suportariam tamanha injustiça. A se soubesse que ela sabe que a justiça foi feita, ao menos teria um pouco de descanso das trepidações inerentes da vida, que quando revividas sem alento descamam ainda mais as feridas.

Simples

O estado de se perder em si próprio
Suplanta toda alternativa vaga
Ócio de ninguém, digressão que propaga
o recanto febril, o átrio, o vazio...

Em fins de tempos as mudanças temporais pouco importam
A moça do tempo dos telejornais
nos dispersa do horizonte que se apaga
tais mudanças dessa nossa vida repleta
pré-constrói os silêncios noturnos
embalados pelo olhar do poeta

De que vale robotizarmos o futuro?
Estar seguro em insosso muro
que aparta as gentes
e nos torna dementes
inaudíveis aos ventos decorrentes
do balé das borboletas
das simples borboletas.